VIGÍLIA DA DIGNIDADE
Juntar os diversos grupos religiosos não é tarefa simples. Nem no mundo nem no Brasil. Mas demos passos importantes nos últimos anos e um exemplo disso é a Caminhada em Defesa da Liberdade Religiosa, que leva milhares de pessoas de todos os credos anualmente à orla de Copacabana. Mas a Caminhada não está sozinha. Organizações civis e religiosas como o Instituto de Estudos da Religião (ISER), o KOINONIA Presença Ecumênica e Serviço, a Comissão de Combate à Intolerância Religiosa (CCIR), o Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil (Conic) e o Movimento Inter-Religioso (MIR) estimulam o diálogo entre as religiões em torno de uma agenda social relevante, produzindo e apoiando eventos como a Vigília da Dignidade, que ocorreu no último 1º de agosto, na Cinelândia.
Inspirado na dupla conotação do termo vigília – a religiosa e a laica –, o evento promovido pelo Conselho Mundial de Igrejas (CMI), People’s Movement for Human Rights Learning (PDHRE) e Unicef passou por 11 países antes de chegar ao Rio de Janeiro, estimulando a vigilância sobre temas que ameaçam a justiça, a paz e os direitos humanos, unindo movimentos sociais e grupos religiosos em defesa da dignidade.
Paz e voz
Para Ednalva Tavares, do Brahma Kumaris – um movimento espiritual fundada na Índia –, o termo dignidade está relacionado com consciência e autorrespeito. “É a habilidade de alinharmos atitudes mentais, palavras e ações com os valores autênticos e genuínos. Devemos contribuir para nosso desenvolvimento emocional e espiritual, mas também para o de nossos semelhantes”, ela ressaltou.
Esse compromisso com o outro, acima de eventuais divergências religiosas, é uma das grandes motivações da Vigília para o diretor executivo do KOINONIA, Rafael Oliveira. “O diálogo formal entre as lideranças é importante, mas o encontro com a população em sua condição real, em que direitos fundamentais são sistematicamente desrespeitados, precisa ser exercitado e aprofundado.”
O encontro mencionado por Rafael ocorreu nas rodas de debates organizadas na primeira parte do evento, quando lideranças como a Ialorixá Adriana Martins denunciaram o alto índice de homicídios contra a juventude negra e violações de direitos envolvendo mulheres, negros e indígenas. No debate sobre a igualdade de gênero, a reverenda Inamar Corrêa de Sousa, da Igreja Episcopal Anglicana do Brasil, trouxe o foco para as próprias estruturas religiosas. “No Brasil, há uma enorme dificuldade de as mulheres dirigirem o clero. Em nossa igreja não há nenhuma delas no cargo máximo, que é o episcopado”, lamentou a reverenda.
Participação e avanços
“A sociedade só tem a ganhar quando colocamos o bem público e a dignidade humana acima de divergências teológicas”, analisa o pesquisador Clemir Fernandes, do ISER, citando a criação do Grupo de Trabalho e Enfrentamento à Intolerância Religiosa e do Comitê Nacional de Respeito à Diversidade Religiosa como marcos importantes deste processo.
“Estamos avançando”, diz o interlocutor da Comissão de Combate à Intolerância Religiosa (CCIR), Ivanir dos Santos. “No Brasil, o ecumenismo sempre foi uma postura isolada das lideranças. Estamos tentando romper com isso. Ao promover eventos como esse, demonstramos mais compromisso e coragem para assumirmos o diálogo e trabalharmos realmente juntos.”